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10 Outubro 2005

361 a 365 (gude a Hitchcock)

361 - gude
No leito da morte, o ancião relembrava toda a sua vida. Tudo o que desejava agora era ter de volta suas bolinhas de gude.

362 - dupla
Dr. Jekyll e Mr. Hyde formaram uma dupla caipira. Os espetáculos foram um fracasso, pois quando um subia ao palco ninguém achava o outro.

363 - lolita
Lolita era tão terrível na arte da sedução que seu ursinho de pelúcia vivia morto de tesão.

364 - maestrina
Na cozinha as panelas cantam, na sala os estômagos roncam. A maestrina dá os últimos toques nessa sinfonia com o tilintar dos talheres ao pôr a mesa.

365 - hitchcock
Olga gostava tanto de viver com segurança momentos de pavor, que sempre colocava fundos musicais de filmes de Hitchcock ao tomar banho no chuveiro.
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02 Outubro 2005

351 a 360 (buzina a caviar)

351 – buzina
Aqueles dois olhos luminosos, destacados na noite, avançavam em sua direção. Quando o alcançaram, uma buzina foi a última coisa que ouviu.

352 – sorvete
Manuela chupava o sorvete muito lentamente. Mas quem se derretia eram os olhares que testemunhavam a cena.

353 – paixão
Ele estudara a Bíblia, o Corão, o Talmude, Confúncio, Buda e Platão. Mas continuava não entendendo bulhufas acerca da paixão.

354 – livros
Plena madrugada, naquele prédio estava sempre acesa a terceira janela. Um doente terminal vivia com intensidae, lendo todos os livros que ainda podia.

355 – flores
Flores murchas ornavam as janelas da velhinha meticulosa. Os vizinhos distraídos e a família ausente demoraram meses para achar seu cadáver na sala.

356 – reeleição
Quando o velho deputado perdeu pela primeira vez uma reeleição, a família agradecida fez uma grande comemoração.

357 – almofada
Ao sonhar com o namorado, Débora dormia abraçada com a almofada. Ao acordar, ela estava toda molhada.

358 – suspiros
Tarsila fugia do mundo na biblioteca. Lendo fogosos romances, soltava discretos suspiros, atraindo os sáficos e platônicos olhares da bibliotecária.

359 – casal
José, Pedro e Maria formavam um casal. Como assim? Simples. Para eles era muito bom e natural.

360 – caviar
Severino comeu caviar e arrotou. Que saudades da buchada de bode! - suspirou.
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23 Setembro 2005

341 a 350 (ombudsman a cafetina)

341 – ombudsman
Era uma facção tão institucional do crime organizado que criar o cargo de ombudsman pareceu até natural.

342 – crueldade
Supremo requinte da crueldade, ela lambia os dedos depois de comer chocolate, saboreando o súbito silêncio dos colegas no escritório.

343 – bruxas
Congestionamento de vassouras na convenção das bruxas. Os semáforos, enfeitiçados, piscam em todas as cores.

344 – gagarin
Gagarin viu a Terra azul. As guerras a fizeram avermelhada. Com a poluição, está ficando toda cinzenta.

345 – compradora
Ela era uma compradora tão compulsiva que até para seus inimigos gostava de adquirir pequenos presentes.

346 – hipocondríaco
Antenor era um hipocondríaco de grande erudição. Além dos remédios que tomava, milhares de outras bulas formavam sua ampla coleção.

347 – furacão
Um pequeno furacão seguido de uma grande inundação, foi o que bastou para mostrar o terrível país por trás daquela nação.

348 – trote
Puxada pelo cachorro, a franzina senhora trotava pelas calçadas do bairro, usando suas poucas forças apenas para se desviar dos transeuntes.

349 – saudades
Sempre que um deles viajava, ficavam com tantas saudades que acabavam brigando feio antes do reencontro.

350 – cafetina
No Congresso Nacional, nenhuma bancada tinha tantos deputados como a agenda daquela cafetina.
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20 Agosto 2005

331 a 340 (picolé a tempo)

331 - picolé
Tião vende sorvete e vive rodeado pela meninada. Gosta de oferecer seu picolé é quando algum dos pequenos clientes vem acompanhado da empregada.

332 – varal
As roupas penduradas no varal ganharam vida durante o vendaval. Pularam para o vizinho. Depois, extenuadas da aventura, descansaram caídas no quintal.

333 - tribunal
No tribunal, acusado de gerontofagia, assumiu sua culpa; mas, ante a suspeita de pedofilia, declarou-se inocente o lobo mau.

334 - xadrez
O cavalo comeu a rainha, o bispo foi comido pelo peão. Ao ver tamanha depravação, dona Eulália proibiu o neto de continuar a jogar xadrez.

335 - quadris
Na varanda da vizinha, as calcinhas postas para secar ao vento agitavam-se como se fossem movidas pelos quadris de sua dona.

336 - insônia
Latidos ao longe, na madrugada, eram a única companhia que ele tinha naquela noite de insônia, na cama gelada.

337 - lareira
O crepitar da lenha na lareira não era alto o suficiente para abafar os gemidos e murmúrios dos dois corpos nus que se enroscavam no chão da sala.

338 - bailarina
Sem ninguém para lhe dar corda, numa eterna pose, a bailarina da caixa de música foi envelhecendo, coberta de pó, num canto esquecido de um armário.

339 - amanhecer
O galo canta ao amanhecer, avisando o amante da mulher do guarda-noturno que é hora de se vestir e correr.

340 - tempo
O casal de viajantes do tempo brigou feio. Separaram-se. Ela foi para antes de ele nascer; ele para depois de ela morrer.
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18 Agosto 2005

321 a 330 (maluco a atitude)

321 - maluco
Era um cientista maluco, achava que tinha sido ele a inventar a bicicleta, o iogurte e o relógio de cuco.

322 - Paris
Foi a Paris e subiu na Torre Eiffel para realizar uma velha fantasia, jogar dali um aviãozinho de papel.

323 - andarilho
O andarilho caminhava sob um sol escaldante. O calor, cada vez maior, dilatava a estrada e dobrava a distância a ser percorrida.

324 - família
Papai é um assassino e titio ladrão. Mamãe estelionatária e o filhinho um delator. Agora a família está toda reunida na prisão.

325 - mucama
Anastácia era uma linda mucama. Ia com a senhora às compras, fazia quitutes para as crianças. Mas suas mais belas prendas servia ao senhor na cama.

326 - auto-ajuda
Em seus livros de auto-ajuda o gordo e triste autor ensinava como emagrecer e ser feliz.

327 - enforcado
No cadafalso, prestes a ser enforcado, dedicou os últimos instantes de vida a procurar na multidão aquela que seria homenageada com sua última ereção.

328 - vestidos
Ela colecionava sapatos e vestidos. Mesmo que não mais os usasse, jamais se desfazia deles - ao contrário dos maridos.

329 - braguilha
Muito circunspectos e profissionais, voltaram do almoço secretária e patrão. Ela toda alinhada, porém ele com a braguilha desabotoada.

330 - atitude
Um lance, uma parada, aquela mina era toda ligada. Mó legal, chegada nos manos, cheia de atitude, mas quando dizia algo ninguém entendia nada.
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12 Agosto 2005

311 a 320 (magrinha a Drácula)

311 - magrinha
Para ficar bem magrinha, ela vomitava várias vezes ao dia. Quando se suicidou, pulando do vigésimo andar, seu corpo caiu a muitos quarteirões dali.

312 - aposta
Perdeu o bigode numa aposta. Mais tarde foram-se o carro, a casa, a mulher e os filhos. Hoje é eunuco e parou de arriscar no jogo.

313 - girafa
Juliana era uma girafa muito vaidosa. Vivia com torcicolos, por tentar se admirar em todos os espelhos que encontrava.

314 - bingo
Todo o mês, ela perdia metade da aposentadoria na casa de bingo. Afinal, desculpava-se, era o mesmo tanto que seu marido gastava quando vivo no bar.

315 - revólver
Romeu achava que ter um revólver carregado em casa era garantia de defesa. Mas não pôde defender seus filhos quando pegaram a arma para brincar.

316 - pecados
Arrependida dos pecados que não cometeu, a velha beata rezava para que no paraíso não fosse tudo igual!

317 - nhoque
Com as respectivas dentaduras sobre a mesa, o casal de velhinhos protagonizava um espetáculo obsceno ao comer uma lauta refeição de nhoque ao sugo.

318 - calcinhas
Quem olhava a vetusta senhora que passeava no shopping jamais suporia que seu discreto sorriso devia-se a estar sem calcinhas sob o vestido.

319 - aftas
Caprichando com os lábios e a língua, Pedrão aprofundava o beijo na tímida garota, que se contorcia e gemia sem coragem de dizer que estava com aftas.

320 - Drácula
O conde Drácula era um atencioso anfitrião. Sempre alimentava seus convidados antes de estes lhe servirem de refeição.
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14 Julho 2005

301 a 310 (fumo a malabarista)

301 - fumo
Quando era jovem queimava fumo escondido dos pais. Hoje fuma escondido dos filhos.

302 - zona
O matuto foi para a cidade grande. Logo procurou a zona. Quando o avisaram que ali era tudo travesti, foi aliviado, sem o receio de encontrar a mãe.

303 - editorial
Era ele quem escrevia todos os dias o editorial. Não acreditava em nada mas, redator competente, dizia o que queria o dono do jornal.

304 - barriguinha
Ela adorava andar com a barriguinha de fora, pois atingia dois objetivos de uma só vez: despertava a cobiça dos transeuntes e os ciúmes do namorado.

305 - pingüim
Lineu era um pingüim atípico, bem friorento. Por isso, trocou seu emprego numa fábrica de geladeiras por outro num sistema operacional.

306 - virgem
Há muito que Paulinha não era mais virgem. Seus pais achavam que sim, mas os que acompanhavam seu blog na internet sabiam até de todas as minúcias.

307 - freira
A freira fazia tricô no aeroporto. Depois que passou um belo comissário de bordo, observado pelo canto do olho, ela teve que refazer várias fileiras.

308 - swing
No clube de casais, o swing rolava solto. A troca nem sempre ocorria, mas a devolução era garantida.

309 - fantasmas
Na casa assombrada, os fantasmas escondiam-se apavorados toda a vez que os novos moradores ligavam a televisão.

310 - malabarista
Quando o malabarista chinês fazia acrobacias com seus bastões pegando fogo, desenhava misteriosos ideogramas no ar.
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11 Julho 2005

291 a 300 (falsário a barzinho)

291 - falsário
Que injustiça! - pensava o falsário, preso com vários documentos de identidade. Fernando Pessoa também tinha heterônimos e nunca fora em cana!

292 - contrato
Na hora de assinar o contrato com a casa de espetáculos, o adestrador de pulgas foi muito reticente, recusando-se a colocar os pingos nos is.

293 - Gestapo
Otto tinha trabalhado na Gestapo. Agora, já bem velhinho, limitava-se a arrancar devagarinho as pernas das moscas que conseguia capturar.

294 - quentão
Na festa junina beijou todas. No dia seguinte, as fotos estavam na internet. Era o cruzamento do quentão com a tecnologia.

295 - araponga
O araponga falava latim com fluência. Tinha aprendido a espionar no seminário.

296 - lacônico
Era um anão lacônico com dotes literários; o máximo que conseguiu escrever até hoje foi um microconto.

297 - remorso
A cabeça do viado adornava a lareira com seus galhos e um eterno olhar meio acusatório, que trazia algum remorso aos descendentes do caçador.

298 - preguiçosa
Ela estava tão preguiçosa que, naquele dia, quando o amante a convidou para sair, preferiu traí-lo com o próprio marido.

299 - bola
Eram onze com camisa e outros onze sem. Todos corriam atrás duma bola já descapotada, único componente do jogo que não gritava ordens ou xingamentos.

300 - barzinho
O casal encontrou-se no barzinho. Sentaram-se à mesa e cada um atendeu seu celular. Quando ambos desligaram, voltaram a ficar em silêncio.
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04 Julho 2005

281 a 290 (moleques a inquisição)

281
Os moleques jogavam bola no meio da rua. Num passe mais forte, um deles correu para evitar a saída da pelota. Mas não evitou o motorista desatento...

282
Ao comer um pé de moleque, quebrou um dente. Devia ter deixado cozinhar por mais tempo, observou seu colega canibal.

283
Que saudades da ditadura! - lamentava-se o humorista, cada vez mais suplantado pela realidade dos fatos.

284
Olha só, um CD de antigamente! - exclamou a arqueóloga mirim ao achar um velho LP em vinil na casa do avô.

285
Horácio era muito pontual. Qualquer atraso, de poucos minutos, para ele era uma ofensa moral.

286
O número de loucos é infinito. A demência é universal. Eu mesmo não sou muito normal.

287
Sentados, na calçada em frente de casa, o casal de velhinhos cumprimenta todos na rua, como se passassem dentro de sua sala.

288
O velho dinossauro trabalhava como fóssil no museu. Achava muito enfadonho não poder se mexer, mas eram os ossos do ofício!

289
Nas ruínas da velha casa, muitos anos depois, ela ainda podia ver as manchas de sangue onde fora o quarto dos pais.

290
Frei Adroaldo trabalha na Santa Inquisição. Arranca unhas com toda a piedade e usa o ferro em brasa com muita devoção.
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03 Julho 2005

271 a 280 (suicídio a esquerda)

271
Sorri, amor - pediu ela. Já arrependido do pacto de suicídio, ele foi incapaz de satisfazer esse seu último desejo.

272
Doutor Ortega era um homem muito sisudo, jamais sorrira em toda a vida. Ao dar a primeira gargalhada, não parou mais, até ser internado pela família.

273
Enojado com o que viu, renunciou ao cargo e abandonou a capital federal. Sem olhar para trás, com medo de virar estátua de sal.

274
Ao ver uma aeromoça, sentia o maior tesão. Até hoje sua mulher não entende por que ele insiste em fazer sexo na poltrona, fingindo estar num avião.

275
Ela pediu: larga do meu pé! E, ali pendurada, ficou vendo o corpo dele afastar-se, caindo no despenhadeiro.

276
Tio Nanias era um palhaço. No boteco, os amigos riam com ele. Mas no circo onde trabalhava ninguém achou graça quando ele foi promovido a gerente.

277
O homem-avestruz era muito recursivo. Ele mesmo criava em sua cabeça os buracos onde a enfiava.

278
Pegou a mala errada no aeroporto. Apaixonou-se perdidamente pelo perfume das roupas que ali estavam e até hoje tenta achar a quem pertencem.

279
Ele era tão cheio de minúcias que nem os menos chegados lhe perguntavam mais como estava.

280
Ele era de esquerda. Era. Agora está no poder. Está.
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28 Junho 2005

261 a 270 (malvada a atrasado)

261
Letícia era muito malvada. Todos os dias passava bastante cera nos degraus da escada.

262
O vendaval fazia um galho da árvore tamborilar na janela do velho telegrafista, trazendo-lhe estranhas mensagens em código Morse.

263
Tóbi era um cachorro muito inteligente. Quando o dono o chamava dizendo "você vem ou não vem?", ele ia ou não ia...

264
O maior trauma do vampiro narcisista era não poder se admirar ao espelho.

265
O diretor do manicômio proibiu os pacientes de verem os noticiários da televisão, pois eles já estavam começando a acreditar no que era transmitido.

266
Dona Izilda tinha muita esperança e orgulho em seus alunos. Quando foi assaltada por dois deles, levaram-lhe muito mais que dinheiro.

267
Na cozinha, Ana era muito temperamental. Quando não exagerava na pimenta, abusava do sal.

268
Leila vivia no mundo da lua. Quando passeava sozinha de noite, era iluminada pelo grande planeta azul lá no céu.

269
João das Regras era muito meticuloso. Quando pegou sua mulher com outro, estipulou que ela jamais o faria a não ser às quartas-feiras.

270
Era um sujeito tão atrasado que sua sombra só ficava embaixo dele quando já começava a anoitecer.
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23 Junho 2005

251 a 260 (barba a capataz)

251
Colocou a barba na cara e deixou um cachimbo lhe crescer na boca. Agora, com certeza, suas opiniões seriam respeitadas!

252
Seu Malaquias é um pacato e respeitável aposentado. Mas, quando entra no mundo virtual, torna-se um fauno eletrônico, usando o nick Peba na Pimenta.

253
Nêgo tava numa nice quando pintou um brother com o berro na mão. Apresentou um fininho e, na moral, queimou o chão.

254
O pedante erudito, ante os prenúncios da precipitação pluvial, titubeou em prosseguir seu périplo, pois pedia um guarda-chuva e ninguém entendia nada.

255
A aluna ninfomaníaca escrevia toda a cola da prova nas coxas e deixava os colegas olharem tudo.

256
Era apenas uma fotografia, mas espetar-lhe os alfinetes dava-lhe quase tanto prazer como se os enterrasse na carne dele.

257
Ele sonhava ser astronauta, nem carta de motorista tirou. Ela queria ser princesa, da favela nunca passou. Quando se conheceram, nada disso importou.

258
Ajuda ele emprestava a juros. Amor só dava a prazo. Rancor era à vista. A gratidão só recebeu fiado.

259
Apaixonou-se pela vizinha vendo-a à janela. O dia que tocaram à campainha e a viu pelo olho mágico, não teve coragem de abrir a porta.

260
Aquele capataz era pau para toda a obra. Mas os operários viviam reclamando de serem enrabados a toda hora.
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22 Junho 2005

241 a 250 (lucidez a pouco)

241
Quando Otacílio olhou pela janela do avião e viu sua avó sentada na asa a fazer tricô, teve um último lampejo de lucidez e soube que estava louco.

242
Casa de ferreiro, espeto de pau - desculpava-se o carrasco perante sua mulher ao se recusar a esmagar aquela barata na cozinha.

243
O cérebro havia encolhido, apontava o encefalograma do escritor de microcontos.

244
Quando criança, era sempre o último na chamada escolar. Superado o trauma, virou herói e passou a assinar sua inicial com a ponta da espada.

245
Por centenas de anos mantiveram o culto secreto. Agora reconhecido e oficializado, começaram a perder a fé.

246
Como é que podiam chamar as residências de imóveis? - perguntava-se a tartaruga, ao ler as notícias do sistema habitacional.

247
O soutien dançando, a calcinha apertando os bagos. Ai, minha amiga, às vezes não é nada fácil esta vida de drag queen!

248
No meio da cerimônia do chá, o monge soltou um sonoro e inadequado peido. Por muito menos, seu avô tinha feito harakiri.

249
O homem da mala ia de gabinete em gabinete, tratando os deputados como se fossem flores, fertilizadas pelo pólen da corrupção.

250
Depois que ela partiu ele achou que havia morrido um pouco. Mas estava enganado, pois pouco era muito pouco...
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18 Junho 2005

231 a 240 (maestro a gângster)

231
O velho maestro, já bem alcoolizado, brigou com o barman, que não obedecia sua regência com o tilintar dos copos que lavava.

232
Quando ela recebia algum homem, a vizinha de baixo até desligava a inseparável televisão, para melhor monitorar todos os ruídos e murmúrios.

233
Com um binóculo na mão e uma parte de seu corpo na outra, o jovem voyeur esquadrinhava metodicamente todas as janelas da vizinhança.

234
Ela era a princesa do mundo virtual, com centenas de amigos no Orkut, para compensar os que não tinha na vida real.

235
Ela usava piercing na língua e ele no genital. Tiveram que ser socorridos após muitas horas presos no sexo oral.

236
Seu pai fora bicheiro e jamais jogara. Ele era traficante e nunca cheirou. Como foi que justo sua mulher, aquela puta, tinha gozado com o cliente?

237
O detetive, na campana, esperava para fotografar mais um adultério. Ao ver a entrega dos amantes, mudou de profissão.

238
Dona Rosa andou de avião pela primeira vez na vida. Ao ver tantas nuvens lá embaixo, desenhando bichos e castelos, ficou com saudades de sua infância.

239
A chaleira apitava e a velhinha, já meio surda e gagá, saiu correndo para pegar o trem.

240
Em outra encarnação ele tinha sido um perigoso gângster. Hoje, professor numa escola da periferia, tinha o carro arranhado pelos alunos.
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09 Junho 2005

221 a 230 (fast food a Photoshop)

221
Perpretou bárbaros crimes na guerra. Ao retornar ao lar, voltou a massacrar apenas grandes quantidades de fast food.

222
A gordinha sensual parecia saída de um quadro de Botero. Namorou longamente a vitrine de doces mas, suspirando, pediu apenas um café sem açúcar.

223
O gato foi treinado a só fazer xixi na caixa de serradura. O dia que esta acabou, lá se foi a farofa do almoço da família.

224
No túmulo do bígamo, as duas viúvas perguntavam-se quem seria aquela desconhecida que aparecera no enterro.

225
Ela faz striptease e ele é michê. Viraram crentes e agora tentam converter seus clientes.

226
Napoleão bebera cicuta e Sócrates fora envenenado por arsênico, afirmava o convicto historiador oligofrênico.

227
O velho milongueiro, todo de preto, murmura com fervor as letras dos tangos no ouvido de cada parceira de dança.

228
Quando o cego tocou pela primeira vez a intimidade de uma mulher, sentiu como se a Pedra de Roseta estivesse em braille, pedindo para ser decifrada.

229
A mentira tinha pernas curtas e não alcançava a verdade. Colocou saltos altos, mesmo sem ir muito longe, ficou bem mais charmosa.

230
Era tão vaidosa que, para tirar fotografias, gastava uma hora e meia ao espelho e outro tanto no Photoshop.
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06 Junho 2005

211 a 220 (profecia a corrupção)

211
A antiga profecia era clara e aquela criança foi colocada no trono real. Hoje, as coisas não eram tão óbvias, mas depuseram-no assim mesmo.

212
Urinou e sacudiu duas ou três vezes o pinto. Acordou e, num susto, levou a mão entre as pernas. Ufa, ainda era uma mulher!

213
Bateram à porta. Era um mendigo com uma pedra na mão querendo fazer uma sopa. Deu-lhe um cubinho de knorr e despachou-o logo.

214
Sentia-se um homem pela metade, sempre dividido. Até hoje não perdoava aquele maldito rei Salomão!

215
Godzilla invadiu o Vaticano, pisando em tudo e abocanhando clérigos em fuga. Seus urros eram ainda mais assustadores pois não tinha papas na língua.

216
Quando a carpideira ficou viúva não verteu nenhuma lágrima no velório. Afinal, família é família, negócios à parte.

217
Nunca mais foi à igreja pois agora encontrara Deus em outro templo, o corpo da mulher amada.

218
Que saudades da clandestinidade! - pensava o velho militante ao ver seus companheiros no poder.

219
A mulher-gorila fugiu com os irmãos siameses. Denunciados pelo dono do circo, eles foram presos por bestialismo e ela por bigamia.
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220
Ele era inocente, mas só quando subornou o juiz é que foi absolvido no processo por corrupção.
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04 Junho 2005

201 a 210 (celular a Presidente)

201
Ela não largava o celular. Quando ia ao banheiro, seu marido telefonava para saber se ainda iria demorar.

202
Bita era uma formiga ninfomaníaca. Um dia conheceu Bartolomeu, um tamanduá, que a comeu todinha.

203
Silas era o peixe mais vagaroso do seu cardume. Quando os outros já estavam fritos, ele ainda estava sendo pescado.

204
Era um assassino serial. Matou a aula e foi ao cinema. Traçou um lanche e matou a fome. Depois, sem mais nada para fazer, ficou matando o tempo.

205
Deitado na rede, ele observava uma fileira de formigas carregando todos os seus problemas para algum lugar longe dali...

206
Era um cornudo tão orgulhoso e machão que quando um cara não quis comer sua mulher encheu-lhe a cara de porrada.

207
Era um sujeito tão racista que deserdou os filhos quando voltaram das férias na praia.

208
Padre Joel odiava os casamentos e batizados, mas nos enterros tinha até que conter sua satisfação.

209
Armandina caminhava descalça na rua molhada. Esse era o último prazer que ainda lhe restava.

210
Quando o Presidente soltou um peido, os que estavam diante dele fingiram que nada ocorrera, mas os que estavam atrás não puderam fazer o mesmo.
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191 a 200 (média a laxante)

191
No emprego o ambiente era estressante; tinha que fazer média o dia todo. Pra compensar, na padaria sempre pedia em copos separados o café e o leite.

192
Seu Ermelindo roncava tão alto que ele mesmo em seus sonhos não conseguia dormir.

193
Desde a contratação do novo salva-vidas, aquele rapagão forte, os casos atendimentos de socorro na praia tinham aumentado imensamente.

194
O pequeno órfão da rua busca a mãe em qualquer um que lhe estenda a mão e procura o pai em todos os que lhe dão o pão.

195
Noite após noite, ela escapou da decapitação. Mil e uma vezes teceu mundos com sua narração.

196
Os decapitados andavam sobre as mãos ou arrastavam-se de joelhos. Era um pesadelo sem pés nem cabeça.

197
Maria Rita arrancou os olhos de sua boneca. No lugar colocou os que tirou do irmão.

198
Numa tarde sem vento, de onde vinham tantas ondas naquele lago calmo? Um bote com dois namorados fornecia, mudo, todas as respostas.

199
Arlete esperava o avião. Todos foram pousando, só o de seu namorado não.

200
O ministro da economia vivia com prisão de ventre mas recusava-se, por princípio, a tomar laxante.
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03 Junho 2005

181 a 190 (onanista a quimioterapia)

181
O jovem onanista era hábil em navegar pelos websites e salas de chat com uma só mão no teclado.

182
Ele nunca errava. Ao contrário, sempre tinha ótimas e detalhadas explicações para suas maiores cagadas.

183
Alfredo era, há muitos anos, um convicto vegetariano. Mas, ao ver aquelas carnes abundantes e suculentas rebolando, ficou com a boca cheia de água.

184
Há muito tempo não precisava mais usá-la, mas a bengala tornara-se parte integrante da sua personalidade.

185
Era um bom cliente do bistrô. Pena que, acompanhando o vinho, quase só consumia guardanapos de papel, onde escrevia pequenos contos sem parar.

186
Era um sósia tão perfeito de si mesmo que nem sua mulher percebia quando cometia adultério com ele.

187
Os vizinhos reclamavam, os cachorros corriam atrás, mas o velho piloto aposentado do oitavo andar continuava a soltar seus aviões de papel.

188
Noite e silêncio. A luz amarela do poste recorta a sombra de uma árvore na calçada. Suas folhas se mexem, agitadas por duas silhuetas nela encaixadas.

189
Os homens da mudança chegaram com o caminhão e encaixotaram tudo o que ela juntara durante a vida, cada pedacinho de si mesma.

190
Com a quimioterapia, seu cabelo havia caído quase todo. Agora, com a luta vencida, deixou crescer cabelo e barba como um velho hippie.
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01 Junho 2005

171 a 180 (Rambo a rei)

171
Ele sentia-se um Rambo na selva. Impiedoso, o velhinho com o mata-moscas continuou sua caçada.

172
O velho marinheiro já estava meio surdo, mas ao encostar a concha no ouvido escutou novamente todos os sons daquele naufrágio.

173
Ao assistir TV na prisão, o que mai o incomodava era estar preso àquela grade de programação.

174
Os dois inimigos reencontraram-se após longos anos. Já bem velhos, não conseguiam mais recordar por que se odiavam.

175
Cada bugiganga a mais que ela comprava, era um orgasmo a menos que deixava de lamentar.

176
Escorregando pelo corrimão das escadas ou arrastando-se por baixo dos móveis da sala, aquele moleque era mesmo um zero zero sete!

177
O orador possuía uma curiosa habilidade: quanto mais falava, menos a platéia entendia o que ele dizia.

178
Quando a loira da minissaia cruzou as pernas, o taxista não pôde evitar a olhada no retrovisor nem a batida no cruzamento.

179
O senador discursava inflamado para uma platéia completamente vazia. Mas a câmara da TV estava ligada.

180
Quando o rei da cocada preta descobriu que ficara diabético, virou republicano. Light.
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28 Maio 2005

161 a 170 (xerox a homem-bomba)

161
Quando a impediram de xerocar o capítulo de um livro, escaneou a própria bunda e imprimiu-a para toda a faculdade.

162
Grana, l'argent, bufunfa, money, dinheiro... Na hora de discutir seu quinhão, todos se entendiam em Babel.

163
Na ditadura Solange trabalhava na censura. Até hoje ela fica molhadinha quando vê uma tarja preta.

164
Tudo acabou entre eles no dia em que disputaram, pela primeira vez, o controle do controle remoto.

165
Como o tempo passa depressa! Já se foi mais um século? Perguntou-se Matusalém...

166
No dia seguinte à noite de núpcias, ela jurou dedicar o resto de sua vida para destruí-lo aos poucos.

167
Era uma senhora tão chata que seu maior interlocutor era o espelho e receber spam no e-mail sua maior alegria.

168
Naquela rua, um novo templo da Igreja Universal. Que pena, era um cinema tão legal...

169
Ela tinha três pares de óculos, para ver de perto, ao longe e os de sol. Mas sempre que precisava usar algum era o que havia deixado em casa.

170
No caixa do supermercado, escolheu a maior fila de todas. E o homem-bomba ficou à espera da sua vez...
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24 Maio 2005

151 a 160 (goteiras a cacique)

151
As goteiras aumentavam, em cadência com um Mozart ao fundo. O maldito violinista estava de novo em cima do telhado!

152
O delegado batucava sambas na delegacia. Naquele plantão, ficou com as pernas bambas ao conhecer Maria.

153
Era um ladrão muito respeitado. Só caiu na boca do povo quando virou deputado.

154
Usava camisinha e sentia-se em pecado, mas quando parou de usá-la e morreu com aids não foi beatificado.

155
Muito organizada aquela mamãe gansa: põe um ovo todo o dia mas dois no sexta, que sábado ela descansa.

156
Era uma moça tão séria que nem quando lhe faziam cócegas na vulva ela sorria.

157
Aquela guerra era uma simulação, mas quando o videogame entrou em curto, foi bem real o choque que queimou sua mão.

158
Tudo lhe era motivo para otimismo. Quando um pássaro defecou em sua cabeça, regozijou-se pelos elefantes não voarem.

159
A gravata era a coleira de sua função. Enforcou-se nela quando soube de sua demissão.

160
O cacique foi levado à cidade grande, onde conheceu avião, computador, rádio, metrô e microscópio. Mas o que mais o impressionou foram as escadas!
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22 Maio 2005

141 a 150 (enfermeira a atropelado)

141
A enfermeira aplicava injeções tão bem que os elogios a seu trabalho eram abundantes.

142
Ele levantou o traseiro da cadeira mas os juros continuaram a tomar-lhe a dianteira.

143
Ele ainda não estava preparado para a inclusão digital e ficou com o analógico a lhe doer.

144
Nua na varanda, ela louvava a lua cheia, acompanhada por dezenas de olhos, atrás das janelas de luzes apagadas da vizinhança.

145
O chapeleiro maluco dava pulos de alegria quando chegava seu melhor cliente, um verdadeiro bicho de sete cabeças.

146
Apesar de agora ele ser um príncipe, ela sempre ficava com um gosto de batráquio na boca após cada beijo.

147
Os semícaros eram um povo unialado, cada qual com uma única asa. Para voar, tinham que escolher alguém e se abraçar.

148
O escritor plantou um pé de feijão mágico, que cresceu muito. Quando ia subi-lo para o castelo nas nuvens, foi detido por violar direitos autorais.

149
Espetáculo diário, a cada degrau que o velho subia, com o auxílio das muletas, soltava cabeludos palavrões, repetidos pelo papagaio do vizinho.

150
Lutando contra a ditadura, passou dos oitenta anos de idade, mas ao dar um mero passeio noturno no quarteirão, morreu atropelado.
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09 Maio 2005

131 a 140 (funerais a funeral)

131
Ele adorava funerais. Misturava-se aos presentes e abraçava-os chorando, como nunca pudera fazer com sua família.

132
Atrás das grades, com o olhar posto ao longe no horizonte, após tantos anos ele já achava que o mundo é que estava preso.

133
Sua memória andava cada vez pior! Quando, finalmente, achou a chave do armário e o abriu, descobriu o esqueleto do amante esquecido.

134
Os sentimentos antigos mexem-se mais devagar e por isso demoram mais para sair do lugar.

135
O coelho que morava na cartola xingava o mágico que o espremia ali com dois pombos, uma dúzia de lenços coloridos e cinco cigarros acesos.

136
Quando o navio deixou o cais, seu espírito rumou célere para o horizonte, enquanto sua alma ficava presa para sempre em terra.

137
A perua gostava tanto de galinhar que para ela todo o pinto valia a pena.

138
"Eu robô" disse o andróide, entregando-se à polícia.

139
Naquela biblioteca, um único livro jamais havia sido retirado. No dia que aquela criança o pegou, o bibliotecário dormiu seu último sono sorrindo.

140
Seu funeral teve tantos discursos que o morto conseguiu ser ainda mais enfadonho do que fora em vida.
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07 Janeiro 2005

121 a 130 (TPM a mosquitos)

121
O gato escondeu-se, o marido conseguiu escapar e os filhos não sofreram muito. Desta vez, sua TPM nem tinha sido das piores.

122
Ele estava completamente hipnotizado pela dançarina do ventre. Meio século depois, continuava.

123
O soldado era pago para matar. Foi dispensado quando começou a pensar.

124
Era uma democracia? O noticiário da TV mostrava tudo - mas só o que o dono da emissora queria.

125
A princesa beijava todos os sapos, esperando desencantar um príncipe. Mas seu pai, o rei, notório engolidor de sapos, não deixava escapar um!

126
O ministro estava sempre com a boca cheia de farofa quando proferia seus discursos explicando os juros à nação.

127
O lanterninha atrapalhado jogava silhuetas na tela, introduzindo novos personagens no filme.

128
As formigas, em longa fila indiana, indo de um quintal ao outro, eram a única coisa que unia aqueles dois vizinhos.

129
Toda nua, ensaboada, ela recordava debaixo do chuveiro aquelas mãos que não eram suas, mas que desejava que nunca abandonassem seu corpo.

130
Naquela sinfonia de mosquitos na madrugada, tentando matá-los, ele sentia-se um maestro com aquela almofada.
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05 Janeiro 2005

111 a 120 (borboletas a momento)

111
As borboletas eram tão lindas e coloridas! Pena que não voavam nem viviam, todas espetadas com alfinetes num quadro.

112
Abre a boca e olha o aviãozinho! Ele abriu e comeu tudo, mas alguns passageiros ainda ficaram presos em seus dentes.

113
Ele adormeceu lendo alguns contos de Augusto Monterroso. Quando acordou, a sogra ainda estava lá.

114
O novo aparelho garantia orgasmos sem fim. Exausta, sem mais forças, ela ainda tentou achar o botão de desligar.

115
Deixou o carro com o manobrista e foi-se embora. Horas mais tarde, quando se lembrou, não conseguiu evitar o vexame na delegacia.

116
O louco no alto da montanha mascava cactos alucinógenos. Quando desceu, formou-se em direito e hoje é um digno promotor.

117
Nabucodonosor era um boi que pastava na Babilônia. Hoje, como touro reprodutor, faz o maior sucesso em Goiânia.

118
Os demônios olhavam para ele com olhos amarelados. Abriu sua alma e, quando viu o olhar deles ficar verde, soube que estava salvo.

119
Um sátiro de bacanais, uma messalina dos carnavais e cinco duendes infernais, aquele sonho foi demais!

120
Num momento normal de si mesmo, olhou-se para dentro e descobriu que há muito tempo não se via.
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03 Janeiro 2005

101 a 110 (costas a vibrador)

101
Seus olhos percorriam as costas desnudas dela, onde liam tantas histórias que o faziam divagar...

102
Ele era um operário padrão. Levantava furiosamente as paredes de tijolos porque a mãe nunca tivera mais que um barraco.

103
Acidente na estrada. Os que passam agradecem por não ter sido com eles.

104
Juca mordia as pernas da dona pois gostava de morder tudo o que lhe pertencia.

105
Foi sua primeira vez num restaurante japonês. Assustou-se com o guardanapo cozido e o peixe cru.

106
O decadente cineasta não fazia mais filmes. Agora colocava o que ainda lhe sobrava de talento para fazer patéticos discursos na TV.

107
Sentada no túmulo, como se estivesse num jardim, a jovem viúva lia poemas para o que tão cedo a abandonara.

108
Era quando ia ao banheiro que o rei, sentado em seu privado trono, gostava de cagar regras para os súditos.

109
Baco estava bêbado e Afrodite no cio. Naquela noite, os deuses no Olimpo não conseguiram descansar.

110
Quando ele descobriu que a namorada tinha um vibrador, ficou indignado, sentindo-se um corno eletrônico.
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02 Janeiro 2005

91 a 100 (ceguinho a colesterol)

091
O maior fetiche do ceguinho tarado era poder ser voyeur.

092
No meio do combate ao crime internacional, o agente secreto teve que parar tudo e obedecer o comando de sua mãe para jantar.

093
De tanto aplicar multas, o guarda de trânsito adquiriu uma lesão de esforço repetitivo.

094
O velho general, na cama, sonhava com todas as guerras que nunca travara mas para as quais toda a vida se preparara.

095
Apague a luz, pediu ela. Me dá um beijo, ele pediu. E para todo o resto não precisaram de mais palavras.

096
No feriado prolongado a cidade vazia estava tão calma como uma aldeia na hora da sesta.

097
Ela recebeu um buquê de rosas. Um espinho perdido tirou-lhe uma gota de sangue, que se escondeu vermelha entre as pétalas.

098
No leito seco do rio, tristes pescadores sem sustento. Mas o choro das nuvens, compadecidas, lhes traz novo alento.

099
Ela era negra e ele judeu. Ela era católica e ele ateu. Ele engordou e ela emagreceu.

100
O colesterol não lhe deixava comer queijos, o diabetes lhe proibia os doces. Ainda bem que trepar não tinha restrições!
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30 Dezembro 2004

81 a 90 (gato a show)

081
O gato foi ao cinema mas não entendeu um miau pois as legendas eram em auau.

082
No restaurante, brigaram feio na hora de escolher entre calabresa e mozarela. A noite não acabou em pizza.

083
A churrascaria não era das melhores. Até as coxas da garçonete pareciam mais suculentas que a picanha.

084
Ele morava no alto da montanha. Depois de tantos anos, já não sabia a diferença entre formigas e humanos.

085
O andróide saiu da fábrica e viu os humanos em greve lá fora, mas não estava programado para entender o que acontecia.

086
Depois de acariciar demoradamente a lamparina mágica, a sensual fada satisfez seus desejos três vezes.

087
Era uma feroz luta pelo poder, sem tréguas nem vencedor final: marido e mulher disputavam o controle remoto da TV.

088
Uma onda gigante levou seu filhos. Outra onda, bem menor, trouxe de volta os seus cadáveres.

089
O grande pirata dominava o mercado da música. Seu inimigo eram os piratinhas que copiavam musiquinhas.

090
O show acabou e desligaram as luzes do palco. Mas ele continuava lá, esperando os aplausos que não vieram.
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29 Dezembro 2004

71 a 80 (retratos a escola)

071
Os retratos que povoavam sua paredes eram os únicos interlocutores com quem a velha senhora ainda conversava.

072
O toca-discos arranhava um velho vinil enquanto uma última lágrima sulcava suas faces enrugadas, agora na paz de um sorriso final.

073
Naquele Natal ele trouxe para casa o filho que havia feito em suas viagens.

074
Os passos da tropa acompanhavam o ritmo do espoucar dos rojões, anunciando a subida da polícia na favela.

075
Ela tinha ciúmes de como ele abraçava o violoncelo. Ainda, pelo menos, se fosse outra mulher...

076
O vaqueiro aboiava ao entardecer e todo o sertão silenciava para se recolher.

077
No meio da madrugada, seu desafio, naquela improvisada gincana, era achar chocolate e abacaxi para a grávida que o aguardava em casa.

078
Na tarde, tão quieta, só se ouvia o tique-taque do relógio e uma mosca tentando sair pelo vidro da janela.

079
Tiros, explosões, membros decepados e muito sangue, era a grande novidade do mais recente seriado americano na TV.

080
Ela ia mal na escola, mas seus Sims, no computador, eram os melhores alunos e só tiravam notas altas.
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28 Dezembro 2004

61 a 70 (alieníenas a incêndio)

061
Os habitantes daquele planeta iam a templos, que eram salas escuras, carregando pipocas e refrigerantes para suas oferendas.

062
O náufrago na ilha deserta agora só tinha os olhos no céu, onde as nuvens desenhavam tudo o que ele precisava.

063
Na noite da cidade, as janelas acesas e apagadas dos prédios formavam códigos ainda não decifrados.

064
A múmia saiu de seu sarcófago e, atravessando a tela do cinema, colocou a todos em alucinada fuga.

065
Nas férias, a chuva no asfalto duplicava a cidade, o céu e seus prédios, refletidos nas ruas molhadas sem trânsito.

066
Era um amor proibido. Ela era histérica e ele deprimido.

067
A natureza odeia o vácuo. Coitada daquela gorda bunda, que ficou presa pela sucção na privada do avião.

068
O assunto do bairro todo naquela semana era o casamento do padre com o travesti.

069
Pela última vez, escreveu seu nome na orla da praia e ficou vendo as ondas o apagarem para sempre.

070
As chamas queimaram tudo. Nos escombros do prédio, aquela privada, branca e reluzente, não fazia o menor sentido.
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27 Dezembro 2004

51 a 60 (caneta a monstros)

051
A caneta estava sem tinta, mas suas palavras ainda eram tantas! Teve que continuar em vermelho, com o que ainda tinha nas veias.

052
O programador estava preso. Seu computador travado. O software não era livre mas ele também não.

053
Seu cabelo era tingido, mas combinava perfeitamente com todo o resto, que também era fingido.

054
Um galope na madrugada. Era uma janela no tempo que trazia ecos de uma heróica cavalgada.

055
Naquela gaveta aberta ele procurava entre todos os objetos um pedaço perdido de sua alma.

056
Um queria respostas e o outro não entendia as perguntas. O sinal do recreio salvava ambos.

057
Ele arremessou-se ao asfalto, rolou para baixo do carro e seus dedos se esticaram a tempo de salvar o anel dela.

058
O garfo caiu ao chão e todo o refeitório silenciou. Em câmara lenta, a faca caiu depois, seguida do baque surdo de um corpo sem vida.

059
O jantar estava pronto e ela serviu-o ainda quente. Seu marido morrera há muitos anos, mas ela ainda colocava seu prato na mesa.

060
Matara todos os monstros e ia subir ao maior nível. Seu desespero saiu como um lancinante grito, na falha da luz que desligou o computador.
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23 Dezembro 2004

41 a 50 (confissão a árvores)

041
Ela era tão provocativa que quando foi se confessar quem teve que rezar muitas ave-marias foi o padre.

042
O gato dormia no tapete da sala, aproveitando a calma da casa antes de darem pela falta do peixinho no aquário.

043
A bofetada deixou-lhe a marca dos dedos na face. Ao pensar em lhe pedir desculpas, desejou sentir novamente aquela mão em sua cara.

044
Um mendigo atropelado na beira da estrada. Os carros se desviam o suficiente para não sujarem os pneus com sangue.

045
Nem a ciência explicava como ele era tão fanho quando administrava e tão bem falante quando fornicava.

046
Ele sonhou que era um soldado americano. Ao acordar, o pesadelo era muito pior. Ele era um prisioneiro em Guantánamo.

047
A boneca caída no chão era a única habitante daquela aldeia destruída.

048
Ela estava calada e seu olhar absorto nada dizia, mas na fumaça do cigarro desenhavam-se os seus pensamentos.

049
O galo de briga perdeu os dois olhos. Assim, não pôde ver seu dono sorrindo com o dinheiro ganho na luta.

050
As árvores passavam céleres pela janela do trem mas seu olhar nada via, parado onde embarcara.
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22 Dezembro 2004

31 a 40 (guarda-chuva a mamilos)

031
O velho guarda-chuva esquecido andou de mão em mão até chegar a um mendigo, seu último destino.

032
O suicida era tão meticuloso que teve que refazer diversas vezes o nó da corda para se enforcar.

033
Ela se prostituía sempre na mesma esquina. Naquela noite só um dos seus sapatos estava lá.

034
O debate estava demorado. Cada intelectual era mais erudito que o outro. Metade da platéia dormia, alguns sonhavam.

035
Seu decote chamava tanto a atenção que, naquela noite, até os olhares que não a fitavam ficaram ruborizados.

036
O careca apaixonado suava tanto ao luar daquela noite de verão que a namorada podia ver todas as estrelas em sua calva lustrosa.

037
Foi no momento mais dramático daquela tragédia que todo o teatro veio abaixo em gargalhadas, ao tocar a pantera cor-de-rosa em algum celular.

038
No fim da festa, o vinho caiu na roupa da mulher e molhou seu álibi.

039
O ministro era muito gordo e o coronel magro demais. Mas nunca fizeram média pois eram muito radicais.

040
Suas colegas riam nervosas, os meninos engoliam em seco e ela ficava ruborizada. Só seus mamilos, bem duros, permaneciam imperturbáveis.
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21 Dezembro 2004

21 a 30 (assalto a parque)

021
Foi assaltado na esquina. Ao esvaziar os bolsos, aquela fotografia caiu ao chão. O ladrão ao vê-la caiu em prantos.

022
A cada tijolo que ele colocava, os muros ficavam mais altos. Mal sabia ele que ali seria o presídio para onde mandariam seu filho.

023
Seu relógio marcava sempre a mesma hora e ele nunca o acertava. O instante da morte dela era o momento eterno onde ele também deixara de viver.

024
Era uma vez uma formiga que ficou desempregada. Quando aprendeu a tocar violão com a cigarra percebeu que ainda tinha toda a vida pela frente.

025
As senhoras jogavam baralho com tanto entusiasmo que não perceberam quando o marido de uma delas se jogou pela janela do apartamento.

026
A velha nunca deveria ter tirado a dentadura na frente do netinho. A partir daquele dia ele tinha mais medo da avó do que dos monstros da TV.

027
Ele foi para o governo e foi atacado por um tipo de amnésia que o fez esquecer de todos os amigos e compromissos antigos.

028
Ela se desesperou ao perceber que a mala não chegara no desembarque, sem saber ainda que esse atraso salvou sua vida.

029
Todas as noites ela sonha com tudo o que não ousa nem pensar durante o dia. Às vezes não consegue dormir. Certa manhã não se dá conta que acordou.

030
O parque fechou para reparos. Era ali seu refúgio quando apanhava do marido. Na primeira vez que ele encheu a cara, teve que matá-lo.
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20 Dezembro 2004

11 a 20 (novela a embaixador)

011
Todo o dia ela assistia a novela. A cada capítulo se apaixonava mais pelo ator. Quando este se casou com a heroína, ela resolveu dar para o vizinho.

012
Juquinha era o mais mal-comportado da classe. Ele fazia de tudo para ser castigado, só para ficar mais tempo com a professora.

013
Matou todos no cinema e voltou para casa ainda a tempo de dar o leite quente e o remédio à sua velha avó.

014
Ele soube que ela tinha outro quando a comida dela deixou de ser a gororoba de sempre. Mas calou-se e engordou.

015
Dom Quixote do asfalto ataca semáforos de vento para resgatar Dulcinéia do congestionamento.

016
O jornal estampava na manchete como a economia ia bem. Debaixo dele, o mendigo que abrigava dormia, agora despreocupado.

017
O garotinho estava correndo e bateu com a cabeça. Teve que levar três pontos, mas só berrou mesmo foi na hora da anestesia.

018
O movimento de tropas não deixava mais dúvidas a respeito da guerra que se iniciava. Mas seu maior problema no momento era cortar aquele bife duro.

019
O torturador não conseguia dormir com os gritos e gemidos de suas vítimas, dubladas pelos pernilongos invisíveis que habitavam sua noite.

020
Ao sorver o primeiro gole de café, a xícara quase lhe caiu das mãos, a boca e garganta queimadas contiveram um grito. Então o embaixador sorriu.
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19 Dezembro 2004

1 a 10 (namorados a mapa)

001
Numa praça, dois enamorados olhavam o verde da paisagem na tarde quente. De repente, a noite subiu e eram estrelas seu olhar...

002
O tradutor deixou todos felizes. Mas se soubesse traduzir ambos os idiomas, o mundo teria visto nascer mais uma guerra.

003
As duas lágrimas, gêmeas de olhos diferentes, juntaram-se finalmente no queixo, de onde saltaram para o abismo.

004
Ele era estúpido e malvado. Foi eleito presidente. No poder, revelou-se muito pior do que o previsto. Foi reeleito!

005
Veio a chuva e a cidade encheu, as ruas e as casas alagaram, os rios subiram e sua popularidade afundou.

006
Tocam buzinas. Fumaça na cara. Farol vermelho. Vendedor ambulante. Vidros fechados. Calor. Medo. Sinal verde. Olhada no relógio. Merda!

007
No campo, um casal de garotos brinca. A menina rasga a blusa no arame farpado. Se olham sabendo que as brincadeiras nunca mais serão as mesmas.

008
O cachorro levantou a saia da mocinha e o vizinho filmou. Momentos depois, o animal recebeu sua merecida recompensa...

009
Ele viera de outro planeta com uma missão. Mas agora que conhecera o sabor de uma mulher, ser mais um maldito terráqueo era seu único desejo.

010
O mapa que herdara assinalava o local do tesouro mas não indicava em que parte do mundo se encontrava. Sem saber, viveu toda a sua vida sobre ele.
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